Para fugir do Papa Boludo I e da Micarecatólica, inventei uma viagenzinha rápida pro interior do Rio Grande (tchê) do Sul, especialmente os municípios de Sananduva e Passo Fundo, região onde uma amiga minha do Rio vive há cinco anos. Demorou porque a preguiça de escrever era grande, mas aí estão alguns comentários aleatórios e cretinos:

– Vou começar cornetando o jeito sul rio-grandense de lidar com o inverno. É muito roots, não sabia, MESMO. Fiquei impressionada, achei que eles tinham um pouco mais de estrutura. Dentro de casa o improviso impera, e em todas as classes sociais: é panela com álcool p/ tacar fogo e esquentar o banheiro antes do banho (sério, ouvi isso de uma local que NÃO É POBRE). Aquecimento na casa toda? Que nada. Nem perto disso. Quem mais tem estrutura tem um aquecedor bem ineficiente, vi vender no mercado, ou então split a 30 graus, que ñ adianta muito também. A maioria tem lareira em casa, mas isso ñ esquenta nada, a não ser quem fica sentado e parado do lado dela. Mas bááá, eu fiquei de cara pela escolha por economia na conta de luz. Como assim? Fora que fiquei um tanto incomodada com a fumaça das chaminés das casas, e as roupas voltaram todas fedendo. Isso eu achei caído, foi um ponto fraco que observei logo de cara, até porque quando cheguei lá a temperatura tava bem baixa, zero grau à noite e temperatura negativa de madrugada. Eu tinha até um ritual de banho: tomar sol no jardim da casa até sentir calor e correr pro banheiro… rs… No dia que não consegui fazer isso, o banho restou devidamente arquivado. E que se dane! 🙂

– Na região tem bastante índio, e eles são bem combativos, brigam pelos direitos. O povo branco local sempre reclama deles, escutei isso de todos. E pela primeira vez na minha vida eu tirei uma foto de um índio no aeroporto (em Passo Fundo) – ele era gordo, tinha celular e usava boné. Minha amiga disse: “Tá vendo?! Os índios aqui são assim!”. Vou postar no twitter a foto! (@missraquel28)

– Presença massiva de senegaleses em Passo Fundo. Vi vários nas ruas. Pelo que ouvi, eles estão lá de boaça, trabalhando e com incentivo do governo federal. É um ótimo contraste pro Rio Grande!

– Vivenciar o provincianismo é sempre uma experiência não tão trivial pra mim. Pro bem e pro mal. Tomar sol no jardim da casa da minha amiga e escutar os locais me cumprimentando e desejando “saúde” quando eu espirrava foi uma coisa muito fofa e que me lincou com a infância. Vi meninas montando casinha com cadeiras e toalhas e brincando na calçada. Isso é uma delicinha. Mas ao mesmo tempo tenho muita preguiça do lado obscuro que tem o big brother de uma cidade tão pequena. É sempre uma sensação estranha de alter regulação, as pessoas curtem muito se alimentar umas das vidas das outras de uma forma que me dá broxura.

– Uma das coisas legais das cidades grandes é que menos importa o que se tem, você tem muito mais valor por outras questões, a cultura do ser tem mais espaço. Nas pequenas localidades a cultura do ter é forte demais (no continente americano como um todo, né?), e isso fica tão clarividente quando se vai a um lugar como o que fui… E no geral, a cultura do ter é mesmo mainstream no Rio Grande, não à toa uma parcela de Porto Alegre acabou sendo um contraponto e um lugar de erupções mais progressistas. O RS é, mesmo, um lugar de dualidade. Pois é, inclusive a província do Rio da Prata adora isso, com as dores e delícias de assim ser.

– De Passo Fundo até Sananduva, a estrada é mão dupla, e isso é uma troço que eu não lido muito bem. Nunca gostei muito de estrada, muito menos essas. A conservação deixa a desejar, esperava um pouco mais de estrutura. Duplicar é necessário. Estrada de mão dupla é um troço muito bizarro, odeio, sempre odiarei, em qualquer lugar! E já sou uma pessoa que tem medo de andar de carro, prefiro mil vezes os ares (serião).

– Ah, o tortei de abóbora! Amei, comi várias vezes. É uma massa caseira recheada, com molho branco incrementadinho. A moça que trabalha na casa da minha amiga fez pra gente, ela mesma faz a massa, com ovo de “colônia”, que seria o “ovo caipira” daqui, acho eu.

– O povo da região fala cantadinho, parece que estão ensaiando uma ópera, muito engraçado!! E tem os “gringos”, que falam um dialeto, um mix de italiano com português, enfim, não os vi, minha amiga que disse. Tô repassando informação.

– O folhado “Catarina” é famoso em Passo Fundo, vale a pena comer. É doce, mas é um doce que é bom. Ir à padaria Cruzeiro sábado à tarde é um programa que muita garotada faz por lá.

– Estrutura de saúde de Passo Fundo é impressionante, uma UNIMED gigante, vários hospitais. Atende a região toda. Minha amiga disse que tem 51 anestesistas ali, olha isso!! Vejam bem: a cidade tem 150 mil habitantes, e tem aeroporto – pequeno, mas tem. E daqui a pouco deve ser ampliado, antes só tinha vôo da Avianca, agora tem da Azul também. Não duvidaria de, daqui a algum tempo, o aeroporto virar internacional.

– Fomos num pub bom em Passo Fundo, pub de responsa, parece inglês mesmo. Bem legal. E tocou uma banda boa, com set list lado b. Joinha.

– Engraçado que os estereótipos sociais ficam bem marcados. Você olha pra pessoa e ela é: ou mainstream coxinha, ou alternativaça, ou gaúcho cowboy. Não tem meio termo, isso é bem marcante… Qual é a novidade, né? Tudo que é lugar é assim… aff…rs

– Queria muito provar os vinhos de colônia, mas fui impedida. Minha amiga que mora lá não gosta e vetou, e acabou comprando vinhos de outros países pra gente beber… rs… Realmente: o vinho tinto, que era o que a gente queria tomar por causa do frio, é o ponto fraco da safra nacional.

– Gente, a bifurcação entre “damas e putas” é um clássico no Rio Grandeee!!! Caramba, eu vi PUTEIROS COM LUZ VERMELHA NA ENTRADA, red lights roots, de verdade, sensacional !!! Surtei quando vi, meu lado socióloga/jornalista galhofeira se encantou ao ver isso com os próprios olhos.

– Amei a experiência antropológica lá, voltaria de boaça, mas não no inverno. A falta de estrutura atrapalha, a experiência fica menos aprazível do que poderia ser. Jantar com a galera local, com os amigos da minha amiga, ir na casas das pessoas, enfim, estas foram as coisas mais legais, e a intenção era essa mesmo. Realmente é uma vivência em que parece que a gente se transporta pra outro universo.

– Quanto ao povo, pra mim vale sempre a óbvia premissa de que, no geral, todos os povos têm um lado bom e um ruim. Os gaúchos têm uma faceta interessante à beça, é um povo com IDH melhor que a média, são educados, os mais roots gostei mais, são mais genuinamente simpáticos e desarmados, o RS é um estado progressista em vários aspectos, inclusive algumas das mais pioneiras decisões judiciais no país vieram de lá, isso é bem legal. Só que, fazendo um contraponto com os uruguaios, acho que os gaúchos ficam atrás no quesito “pátria”. O tempo todo que estive lá recebi pelo whatsapp dos amigos da minha amiga aquelas piadinhas sobre o RS como país, algumas muito engraçadas. Mas chega uma hora que dá uma canseira, dá uma preguiça… rs… O tempo todo precisar se reafirmar é uma coisa meio mala. Acho uma bobagem, acho que os gaúchos são interessantes em vários aspectos e não precisam exagerar na dose da auto-afirmação, até porque é mero blá blá blá. Eu sou, inclusive, adepta da corrente (minoritária, eu sei) que defende que o território nacional não é cláusula pétrea, ou seja, não seria inconstitucional se algum estado ou região quisesse ser independente. Só que o resto do Brasil teria que aceitar, claro. E a região que quiser não mais ter a ajuda federal, que pague o preço por isso, como o Uruguai fez, e muito bem. Irlanda também paga o preço e tá lá, de boaça, com as dores e gostosuras de ser uma “nação livre” da Realeza. Sou mega light com isso, esse papo não me assusta não. E vocês sabem que, se a história da humanidade dependesse de mim, não teria fronteira de porcaria nenhuma. E eu me sinto cada vez mais desterrada, fato: minha alma não é puramente brasileira, e nem puramente “riodejaneirense”, já que sou nativa do Estado do Rio. Minhálma é mucho más que isso. 🙂